Integrantes de tribunais superiores, do MPF (Ministério Público Federal), da PGR (Procuradoria Geral da República), e especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo UOL avaliam que os atos de 7 de Setembro realizados em Brasília e no Rio de Janeiro podem configurar abuso de poder político e econômico.
Essa são práticas eleitorais irregulares que podem levar à cassação da chapa presidencial de Jair Bolsonaro (PL) e à perda de mandato. Procurada, a campanha de Bolsonaro ainda não se manifestou a respeito.
A avaliação de juristas, procuradores e advogados é que os eventos institucionais da Independência se tornaram atos de campanha política, apesar de tentativas do presidente de tentar separá-los durante o dia.
"Misturou atividades". Um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) destacou que Bolsonaro nem sequer focou na comemoração pelo Bicentenário da Independência em seus discursos. "Tem sempre essa nuance. Ele misturou as atividades", disse, em caráter reservado. "A defesa vai ser a celebração de 7 de Setembro, embora ele nem tenha falado disso", acrescentou.
De fato, Bolsonaro ignorou a comemoração do Bicentenário em seu discurso em Brasília e no Rio. O presidente da República usou o palanque para tratar de bandeiras de sua campanha à reeleição, como a proibição ao aborto e o combate à ideologia de gênero, e fazer ataques à imprensa, à esquerda e ao MST (Movimento dos Sem-Terra), por exemplo.
O entendimento dos juristas é que, se ficar comprovado que Bolsonaro usou meios do governo para convocar os atos e transformar um evento público em comício eleitoral, ele poderia ser punido pelo crime de abuso de poder político.
Teve abuso de poder? E, se usou a estrutura do Estado para financiar deslocamentos e transmitir esse evento pela televisão pública, isso poderia ser configurado como abuso de poder econômico. "Às vezes os dois andam juntos", disse o ministro do Supremo.
A posição se assemelha à de um ministro e um ex-ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) também ouvidos pelo UOL. Ambos afirmam que o presidente pode ter cometido abuso de poder político e poderia responder pelos atos na Corte Eleitoral.
Ex-presidente do STF, Carlos Ayres Britto afirmou ao UOL que o discurso de Bolsonaro transformou o desfile de 7 de Setembro em um palanque político com ataques à democracia e ao sistema eleitoral.
O que é abuso de poder político e econômico? O abuso de poder político e o abuso de poder econômico são duas condutas consideradas ilegais pela Justiça Eleitoral que podem levar à inelegibilidade de um candidato por até oito anos, além da perda do mandato e a cassação da chapa eleitoral.
Tanto o Ministério Público como as candidaturas adversárias podem apresentar ações — União Brasil e Rede afirmaram que vão acionar o TSE — para apontar supostos abusos cometidos por Bolsonaro. Este tipo de processo fica sob a relatoria do corregedor-geral eleitoral, posto ocupado atualmente pelo ministro Benedito Gonçalves.
O que dizem integrantes do MPF? Para integrantes do MPF e da PGR ouvidos pela reportagem, Bolsonaro poderia ser enquadrado pelos crimes de abuso de poder político ao utilizar o ato cívico de 7 de Setembro a favor de sua própria campanha, incluindo a participação de servidores do governo.
O abuso de poder econômico, por sua vez, poderia ficar demonstrado no uso de verba pública para montar a estrutura que recebeu o presidente e apoiadores na Esplanada dos Ministérios. O local foi montado para os desfiles militares, mas acabou sendo usado secundariamente durante o discurso do presidente.