Startup que leva água para mais vulneráveis vai representar o Brasil na ONU
23/03/2023 13:52 em NOTÍCIA

Nem sempre é fácil realizar o desejo de ter um copo de água para matar a sede, como aquele da súplica escrita por Dominguinhos e Anastácia, em 1976, na canção "Tenho sede", imortalizada na voz de Gilberto Gil.

47 anos depois, o cenário é ainda mais seco no Brasil que, mesmo em 2023, apresenta em grandiosidade os locais onde a água — tão necessária — não se faz presente, e das torneiras, o vazio que atravessa diversos direitos constituídos por lei.

Para mudar o que se vive, alternativas vêm sendo traçadas para minimizar os impactos da falta, além de conscientizar os brasileiros sobre a situação das regiões sem tratamento e abastecimento.

Assim, nasce a iniciativa Água Camelo, startup de impacto socioambiental focada no mercado ESG. A empresa é responsável pela promoção e o acesso a uma fonte segura de água tratada para pessoas em situação de vulnerabilidade social, entre os centros urbanos, o semiárido e a Floresta Amazônica.

Mais do que intelectuais acadêmicos, o objetivo é captar, também, como essas comunidades redesenham a problemática, buscando soluções para curto e médio prazo.

Na efeméride da Semana Mundial da Água, a coluna traz uma conversa com um integrante da empresa, que nesta semana, está presente na Conferência Mundial da Água, organizada pela ONU.

Leia abaixo a entrevista feita com o CEO da Água Camelo, Rodrigo Belli:

Edu Carvalho: Vocês tinham dimensão de que a água poderia impulsionar o sonho de três jovens, em algo tão urgente para a vida das pessoas?

Rodrigo Belli: A verdade é que a escolha da água, de usar isso como um tema para projeto de impacto, não foi à toa. Surgiu a partir do entendimento de que mais de dois milhões de pessoas no mundo inteiro não tem acesso a água limpa em suas casas. Só aqui no Brasil, 35 milhões enfrentam esses desafios todos os dias.

A gente tinha a dimensão do desafio, e a gente sempre acreditou muito de que poderíamos usar da nossa formação como designers, como ferramenta de transformação social. Sempre correu muito atrás para o impacto escalar e ampliar esse número de pessoas que estamos beneficiando, porque sabemos que ainda estamos na pontinha do iceberg. Hoje, garantimos para mais de 12 mil pessoas um copo de água limpa, tem um espaço muito grande pra chegar em 35 milhões.

Edu Carvalho: De que maneira se dá a interface junto às empresas privadas? Já houve algum desenho tratado diretamente com o Estado?

Rodrigo Belli: A gente vende serviço "be to be", ou seja, de empresa para empresa, pra possibilitar o acesso a uma conta segura de água tratada à comunidades em situação de vulnerabilidade social. Dessa forma, a gente conversa com parceiros para impactar na cadeira produtiva e, assim, que eles possam se engajar no movimento da água tratada para todos do nosso país.

A gente entende que a parceria com as empresas é fundamental para que possa lutar de igual pra igual, entendendo o tamanho do desafio, assim dizendo, que a gente vive. E o Estado sendo extremamente necessário, mas até agora, nenhum projeto sendo feito especificamente.

Edu Carvalho: Trabalhando com a água, de que maneira vocês enxergam que a falta dela atravessa os demais acessos (questão de direitos)?

Rodrigo Belli: A água impacta de maneira sistêmica. Pra gente que tem garantido a água na torneira, no filtro, em casa, desde que nascemos, muitas vezes passa desapercebido o quão fundamental ela é, o quanto é importante o acesso a esse direito.

Nós sabemos que, por exemplo, crianças podem ter maior dificuldade no desenvolvimento cognitivo por conta da falta de acesso à água tratada na primeira infância. Além disso, um adulto que está com diarreia ou doença de hidratação, ele não poderá trabalhar.

Muitas vezes essas pessoas em situação de vulnerabilidade social são autônomas, e deixar de trabalhar um dia é um "sacrifício", com grandes efeitos no final do mês, no processo de renda. E assim, chegamos na questão de saneamento, de evasão escolar de meninas que entram no processo de menstruação. São milhões de reflexos na vida, seja na primeira infância e até mesmo aos idosos.

Edu Carvalho: Vocês farão uma participação na Conferência da ONU, representando o Brasil. De que forma pretendem abordar a temática em um dos encontros mais importantes para o tema?

Rodrigo Belli: Receber esse convite para participar da Conferência Mundial da Água da ONU é muito especial. E mais bacana ainda é ter a oportunidade de estar lado a lado com duas lideranças da Associação Socio-Cultural Yawanawá, que foi nosso grande parceiro durante os projetos no Acre, no Alto Juruá, na Terra Indígena Rio Gregório.

Tivemos resultados excelentes, reduzindo 100% dos sintomas tanto no projeto piloto, quanto na expansão do projeto, que depois levamos para 13 aldeias de terra indígena. Isso não seria possível se não houvesse uma relação próxima a Associação.

Estamos felizes de levar nossa perspectiva, a de uma startup de impacto socioambiental, garantindo o acesso à água para os povos originários, e mais importante: poder ouvir e levá-los para contar e compartilhar a perspetiva deles sobre a falta de acesso à água tratada, como isso se reflete em suas comunidades, e como foi a mudança, os impactos e prejuízos percebidos.

A gente entende isso como um grande palco para mostrar que na Amazônia sim, tem muita água, mas também existem comunidades que não tem água tratada, água segura para consumo. É também uma tentativa de chamar atenção do mundo para a temática. Nada melhor do que a Conferência para abordarmos esse tema.

 

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