Em manifestações anteriores, a Megalic e o vereador negaram qualquer irregularidade.
EMPRESA JÁ FATUROU R$ 54 MILHÕES NESTE ANO
Somente para os seis municípios de Alagoas e dois de Pernambuco que receberam dinheiro do FNDE neste ano foram negociados 1.960 kits de robótica.
Informações obtidas pela reportagem mostram que a Megalic já faturou em 2022 o total de R$ 54 milhões a partir de depósitos de prefeituras para kits de robótica, enquanto só gastou R$ 6,7 milhões. Em 2021, essa diferença foi entre R$ 15 milhões em recebimentos e R$ 2,7 milhões em gastos.
Esse volume recebido em 2022 pela Megalic refere-se a pagamentos feitos pelas prefeituras de União dos Palmares, Canapi, Barra de Santo Antonio, Santana do Mundaú, Branquinha, Maravilha, Flexeiras, Bom Jardim e Carnaubeira da Penha.
Os dois últimos são de Pernambuco e os outros, de Alagoas, e todos receberam pagamentos do FNDE neste ano.
Além destes, também pagaram à Megalic neste ano os municípios de João, Santo Antão, Serra Talhada (de Pernambuco), Ouro Branco (AL) e Dourados (MS). Essas prefeituras não receberam dinheiro federal para
O maior valor recebido pela empresa para kits de robótica neste ano veio de Dourados, no total de R$ 17 milhões. A prefeitura é gerida por Alan Guedes, que é do PP, mesmo partido de Lira.
Dourados aderiu a uma ata de registro do município de Delmiro Gouveia (AL), que colocou a Megalic como fornecedora. Em nota, a prefeitura afirmou que planejou a aquisição de robótica para seus alunos para alcançar a exigência constitucional de alocar 25% das receitas em educação.
"A adesão da ata da ocasião se deu porque as especificações técnicas e pedagógicas do documento atendiam fielmente o que estava proposto no planejamento da Prefeitura de Dourados, bem como baseado nas indicações técnicas do FNDE. Nota-se que o próprio fundo nacional não possuía ata vigente na ocasião", diz nota.
O Ministério Público em Dourados já tem uma investigação sobre o caso, mas não se manifestou, além das outras prefeituras citadas.
A Megalic venceu ao menos cinco licitações ou atas de registros de preços em Alagoas. Todos com a previsão de fornecimento de material didático e cursos de capacitação para professores que incham os valores dos contratos.
Das sete cidades do estado beneficiadas, duas aderiram a uma ata realizada pelo consórcio Conagreste, presidido por Marlan Ferreira, prefeito de Limoeiro de Anadia (AL) e aliado de Lira. Os outros aderiram à ata realizada por Canapi, também da base do parlamentar.
Entre os componentes exigidos no edital, por exemplo, constam dois sensores de luminosidade, um de temperatura, um de som, entre outros.
Tais características coincidem exatamente com kit de robótica produzido pela Pete, e revendido pela Megalic, como consta em memoriais de composição dos produtos elaborados pela empresa.
"Empresas grandes talvez não se adequassem ao padrão exigido. A lista traz características bastante genéricas, sem especificar a qualidade dos componentes, mas quantidades bem específicas, especialmente na parte de atuadores e sensores", avaliou, a pedido da reportagem, o diretor de TI da Secretaria de Educação de Mogi das Cruzes, Pedro Passos.
Segundo ele, entre as empresas de maior porte que ficariam excluídas por não ter condições de satisfazer os pré-requisitos está a Lego, marca dinamarquesa referência de mercado quando o assunto é kit de robótica.
"Um kit da Lego não vem com tal quantidade de sensores, que teriam de ser comprados à parte ou seria preciso fazer um pacote específico para essa licitação compreendendo essas quantidades", disse.
A concorrência da Conagreste, por exemplo, ocorreu em agosto de 2021 e somente a Megalic e uma outra pequena empresa, a Flash, de Minas Gerais, participaram. Assim com a Megalic, a Flash trabalha com o fornecimento de diversos produtos ao setor público.
Ela tinha o melhor preço, com pequena diferença, mas foi inabilitada durante o certame por não conseguir comprovar execução mínima de 30% do volume licitado —e a Megalic assumiu a ata.
A Conagreste não respondeu aos questionamentos da reportagem.
No mesmo mês, o município de Canapi abriu outra concorrência para kits de robótica, em que a Megalic também venceu diante de um edital que trazia as mesmas descrições de produto.
A Flash também concorreu, teve a melhor oferta, mas foi mais uma vez inabilitada por não apresentar documentação exigida.
"Tivemos a impressão que as descrições são as mesmas e direcionadas", diz a responsável pela Flash, Lysllie dos Santos. Ela diz não ter relação com a Megalic e trabalhar com robôs de cinco marcas, incluindo a Lego.
Nesta concorrência de Canapi participaram outras duas empresas: a Hyago Henrique Basílio Alves Sistemas ME, de Atalaia (AL), e a Salto para o Futuro Robótica, de Guaratinguetá (SP).
De uma família de donos de uma escola na cidade, Hyago Alves disse à Folha que desenvolve robôs e já lecionou robótica, mas só participou desta concorrência.
"Parecia que os caras copiaram os termos de alguma empresa, senti isso. Mas não tenho como afirmar [que houve direcionamento]", disse ele.