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Bolsonaro será preso. Pode não ser amanhã, mas também pode; só depende dele
14/02/2024 09:42 em NOTÍCIA

Poucas coisas são tão certas como o conteúdo dessa afirmação. A questão é saber quando. E não estou fazendo graça. Segundo o entendimento hoje vigente no STF, com o qual concordo porque de acordo com a Constituição (Inciso LVII do Artigo 5º), a prisão se dará depois do trânsito em julgado — vale dizer: quando não houver mais recurso. Esse é um tempo judicial e não responde à curiosidade dos leitores, que querem o tempo cronológico, impossível de prever.

Sua prisão pode acontecer antes da condenação? Sim. Depende dele. Como diria o velho Leonel, o Brizola, o bicho está costeando o alambrado, ameaçando romper a cerca — só que, nesse caso, não é a que o separa do terreno do vizinho, mas a que o distancia, por ora, da cadeia.

A reunião de 5 de julho de 2022 demonstra — traz, em verdade, evidências adicionais — que ele e alguns de seus asseclas cometeram os crimes de organização criminosa (Lei 12.850), tentativa de abolição do estado de direito (Artigo 359-L), tentativa de golpe de Estado (Artigo 359-M) e perturbação da eleição (359-N) — as três últimas imputações previstas no Código Penal.

Há mais, e alguns bobos estão a ignorar. A conjuração convocada pelo dito "Mito", e isto é de extrema relevância, não vale apenas pelos atos golpistas combinados naquele dia: ela serviu para iluminar os do passado, escancarando que eram mesmo dolosos, objetivando o rompimento das instituições — e os do futuro (a partir daquela terça-feira reveladora). O bufão anunciou uma agenda de ataque institucional; o general Paulo Sergio Nogueira fez o mesmo; os demais ministros que falaram e todos os que silenciaram concordaram em uníssono, pois: como Lula iria vencer, tinham de impedir o próprio pleito; depois, seria tarde demais, não é mesmo, general Augusto Heleno?

O troço, convenham, já traduzia desespero. Tanto é assim que ele impõe a dieta das "fake news" e ordena sua execução obrigatória, incluindo a pregação sobre o risco comunista... Imaginem ouvir aquilo em silêncio, tendo de fingir que fazia algum sentido. E não descarto, dado o calibre intelectual médio, que muitos ali realmente acreditassem no fantasma. Se bem que Anderson Torres, o que hoje usa uma tornozeleira, resumiu a coisa de outro modo: "Se Lula ganhar, todos aqui vão se foder". Uma gente fina, elegante e sincera...

MESMA TÁTICA

Bolsonaro tem um histórico de ataques às instituições. Os crimes pelos quais é investigado agora se deram de forma reiterada ao longo de quatro anos de mandato. Ele é um investigado. Tenta usar em relação aos processos a que responde na área criminal a mesma tática antes empregada inutilmente contra o Supremo e o TSE: gente na rua. A suposição: se muitos milhares aparecerem, os magistrados vão se intimidar. Mas pensem um pouco: algo que se apresenta desse modo tem um conteúdo silencioso. É como se dissesse: "Ou fazem como queremos, ou haverá desordem".

Daí que ele próprio tenha passado as instruções. Diz no vídeo de convocação:

"Olá, amigos de todo o Brasil, em especial de São Paulo. No último domingo de fevereiro, dia 25, às três da tarde, estarei na Paulista realizando um ato pacífico em defesa do nosso estado democrático de direito. Eu peço a todos vocês que compareçam trajando verde e amarelo e, mais do que isso, não compareçam com qualquer faixa ou cartaz contra quem quer que seja. Nesse evento, eu quero me defender de todas as acusações que têm sido imputadas à minha pessoa nos últimos meses. Mais do que discurso, uma fotografia de todos vocês. Porque vocês são as pessoas mais importantes desse evento. Para mostrarmos para o Brasil e para o mundo a nossa união, as nossas preocupações, o que nós queremos. Deus, pátria, família e liberdade. Até lá, se Deus quiser!"

ANALISANDO O TEXTO

Trata-se de um ato contra o Supremo e contra o TSE. Mas ele pretende lavar a sua natureza com uma suposta defesa do "estado democrático de direito". Proibiu faixas porque não pode ser fotografado ou filmado liderando pregações golpistas, que é o que efetivamente desejavam e desejam ele e seus fanáticos. Nesse caso, a prisão preventiva sairia num estalar de dedos.

Diz que pretende se defender das acusações... Ora, ora... As pessoas se defendem no foro adequado. O intuito não é esse, como confessa: "Mais do que discurso, uma fotografia de todos vocês. Porque vocês são as pessoas mais importantes desse evento. Para mostrarmos para o Brasil e para o mundo a nossa união, as nossas preocupações, o que nós queremos".

Sei lá quantos vai reunir. Qualquer que seja o número, eles multiplicarão, em sua propaganda, por 10, 100, 500... Lembro da "motociata" de 15 de abril de 2022, quando suas milicias digitais tonitruaram 1,5 milhão de pessoas, no que teria sido o maior acontecimento do gênero no mundo. Passaram pelo pedágio obrigatório apenas 3.703 motos.

O valentão quer a fotografia. E acabo de ler um artigo em que um abobado sugere que, se o troço for um fiasco, está mesmo lascado; se houver milhares, então pode ver amenizada a sua situação. Pois eu lhes digo o seguinte: não importa quantos compareçam, a lei seguirá seu curso. Fico cá a me perguntar: qual a chance de um evento dessa natureza não degenerar em palavras e coros de ordem contra os ministros — hipótese em que ele estaria comandar uma patuscada para emparedar um dos Poderes da República?

PRISÃO PREVENTIVA

A manifestação, por si mesma, não é crime. Houve protestos contra o impeachment de Dilma -- e ela não compareceu a nenhum. Mais: noto que o processo de impedimento se dava no Legislativo, não na Justiça. Pessoas foram às ruas contra a prisão de Lula e também a favor. Quando, em 2016, ele foi alvo de um mandado absurdo e ilegal de condução coercitiva, assinado por Sergio Moro (claro!), falou de forma improvisada a seguidores.

Ocorre que o agora presidente não tinha, então, um histórico de ataque às instituições e de articulação em favor de um golpe de Estado. E Bolsonaro?

Prevê o Artigo 312 do Código de Processo Penal:

"Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

Parágrafo Único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares.

1º - A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares;

§ 2º A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada."

Voltemos à fala do celerado. Quando diz querer a "fotografia", confessa que o objetivo é constranger o Supremo — afinal, se ela sair a seu gosto, não busca apenas o gáudio da turma. Não tendo sua ambição satisfeita, certamente não pretende que o ato do fim de fevereiro seja o único. Só faz sentido a concentração se for o início de uma escalada.

Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.

Mais: quais outros investigados estarão no palanque com ele, contrariando uma das restrições cautelares a que está sujeito? Se pretende desafiar decisões judiciais na suposição de que não será preso, digo que está cometendo um erro. Isso seria um encurtador de caminho. Alguns dos que o cercam vão estimular o confronto porque o consideram eleitoralmente virtuoso. O "mártir" seria mais útil na cadeia.

O IMBROCHÁVEL QUER SER PRESO?

Não quer. Continua empenhando em golpear a democracia e o STF.

Tentaram, como vocês sabem, virar a mesa antes da eleição. Não deu. Seguiram no intento depois: não se esqueçam do ataque à sede da PF em Brasília no dia 12 de dezembro, por ocasião da diplomação do presidente eleito, e do atentado terrorista planejado para a véspera do Natal, com um caminhão-tanque que deveria ter explodido no Aeroporto de Brasília. O artefato foi acionado, sim, mas a bomba falhou. Aí veio o 8 de janeiro de 2023.

O chefe da zorra toda segue firme no seu intento de cassar as prerrogativas do STF, como fazia, aliás, quando presidente. Enquanto tentava executar sua política de saúde que correspondia a homicídio em massa, o tribunal salvava milhares de vidas, inclusive garantindo a vacinação.

"Reinaldo, parece que ele decidiu pagar para ver..." Não é isso. É que está desesperado. A reunião do dia 5 de julho de 2022 é, em si, um apanhado de provas sobre a tentativa de golpe e de abolição do Estado de direito. Mais: ela também tornou inconteste a organização criminosa. E escancarou que todos os outros ataques às instituições, ao longo de quatro anos de mandato, foram efetivamente dolosas. O encontro com a cadeia é inevitável, e ele está tentando fazer alguma coisa. Com o mesmo desespero com que buscava evitar a eleição do adversário, alertando que depois seria tarde demais.

será preso. Pode não ser amanhã, mas também pode; só depende dele. Que faça besteira e que seja. Para o bem do Brasil.

 

 

 

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